terça-feira, 22 de setembro de 2009

As Ondas Dos Passos



Passos. Um a um passos são dados e marcados na areia. Um olhar navega no horizonte sobre as cabeças de quem desfruta a visão do nascer do sol e de vez em quando perde-se no infinito do mar. Um ser trafega sozinho marcando o seu caminho na areia fofa. Areia essa que faz papel de livro e registra esses passos. Passos que pela distância de um para o outro nos dizem a velocidade da pessoa que os construía. A nitidez nos fala da pressa, e a continuidade nos informa o humor desse contador de histórias.

“Apenas um par de passos, uma só pessoa. Não distantes um do outro, alguém ali apenas caminhava. Passos nítidos, que significam caminhar robusto, marcado, lento. Nenhum tipo de descompasso. Passos pensativos.”

A pessoa para. Vira-se, vê seus próprios passos, seu caminho, sua memória, admira a jornada. Marcado no solo fica gravada a prova de que ele passou por ali. E não apenas passou, deixou a sua marca, a sua identidade, o seu caminhar. E a areia tem em si a imagem de quem naquele local deixou um pouco do próprio ser.

Admirando o seu caminho ele nota um vento forte vindo do oceano. Ao longe uma onda de tamanho maior se aproxima, e com a força mais intensa que a marcação dos seus passos, a mesma onda chega e apaga a história já vivida até onde a vista alcança. E ali, onde os dois pés se encontram a água não consegue se aproximar.

Olhando a sua história sendo apagada, resta não deixar os olhos sentirem o que sobrou da destruição, e dirige-se pra longe da areia, longe do oceano pra esquecer do que acabou de viver. O mar com suas ondas desmarca e retira a gravação de sua “pele”, e fica apenas aqueles que mostram um único par de passos indo para longe.

“Apenas um par de passos, uma só pessoa. Parados lado a lado tangenciando o mar. Um giro em direção ao longe do oceano e afastam-se da praia”. - Alguém aqui desistiu de caminhar.

A vida faz uma coisa absolutamente lógica no tempo que ela nos permite ter. A vida nos obriga a viver. E por viver, nós nos obrigamos a vivenciar situações, fatos, acontecimentos. A vida nos obriga a fazermos e construirmos história. Essas histórias que nós criamos a partir de nossas oportunidades nos dão o sentido da vida. Essas histórias nos fazem sentir.

O que mais se escuta durante algo de ruim, ou que não deu certo durante a vida são coisas como “esquece cara”. Esquecer... É totalmente sem nexo algo que aconteceu e durou um certo período de tempo ter motivos suficientes pra ser esquecido.

Entre pessoas e suas relações em que o fim é corrosivo, a tentativa de se esquecer está em 9 de cada 10 situações. É óbvio que ninguém consegue esquecer 100% de alguma coisa. Mas quando a dor é grande a probabilidade é de se esquecer 100% do que já fez bem a um desses lados atingindo um dos indivíduos dessas relações é muito grande.

Apagam-se histórias. Apagam-se as próprias histórias pelo medo da dor, pela obrigação interna de não se permitir sentir o sofrimento que acaba mudando as imagens e desfigurando essa mesma história.

As sensações guardadas no inconsciente da lembrança também mudam, prejudicando e destorcendo o verdadeiro e primeiro traçado dos sentimentos que tinham ali sido arquivados no início. A facilidade do ato de se esquecer suprime a dificuldade do sentimento da dor e de perda. Por um lado o que parece bom reprime todo o sentido que fazia o nascimento dessa história.

A vida nos obriga a termos histórias, e não se pode deixar a onda apagar, e se assim acontecer, já que ondas não se controlam, não deve-se desistir de lembrar os verdadeiros passos que um dia por medo o oceano resolveu apagar.

Um comentário: